TCHIM! TCHIM!





último brinde do ano - da Ana e do João - com moscatel de Favaios, what else?!



Que Jano - o dotado de dois rostos, um virado para o passado e outro para o devir - nos abra as portas a um ano mais justo e próspero.
E que o S. Pedro abdique dos maus humores e nos traga o sol "puro e subtil", que tem andado tão arredio e amuado.

Feliz 2010 a tutti!

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DIÁLOGO FRATERNO





- Já reparaste que à medida que crescemos todas as coisas se tornam mais pequenas? Aquele quadro, por exemplo, sim o do castelo, tinha toda a grandeza de um mundo por conquistar e o poder da memória puríssima do desconhecido. Do medo pueril, anterior às caravelas, ao astrolábio, às especiarias, quando havia que atravessar a escuridão, fazer o corredor sem hesitar e enfrentar de olhos abismados o vão das escadas obscurecido.

- Indistinto como o preconceito. E não o atravessamos sempre?! Ah, a temerária e iniciática aventura pelos caminhos do insondável!
- Claríssimo, como o olhar de Atena, deusa da sabedoria. Não reza a prudência que a ignorância é atrevida?!
- !

- Mas já então, com o seu engenho fotográfico, os avós nos traziam a apetência elucidativa. O amanhecer. Repara… não é o bastante para um coração se enternecer e um espírito se animar...?!



Castelo de Almourol | aguarela do meu avô Acácio


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Aguarela da minha avó Maria







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Há calor na quadra
sinos, toalhas de linho
e mensagens doces
regadas com azeite e vinho.





Eu trago as minhas mãos geladas, de tanto percorrer blogues e espiar conversas. E ainda são os risos os sinos que vibram, as luzes quentes que duram.
Que é feito dos meus olhos de leite? Dos meus olhos de lã?
Não sei se me alegre ou se fique zangada, perdura o calor nesta quadra exagerada. Tão forçada como esta rima. Mas o meu Natal vem lá do cimo, do Alto Douro. Vem de longe e traz os montes às costas. Traz o vento frio, que talha a pele, e até a sombra dos penedos. Traz presépios de gente com Meninos Jesus de rostos rosados pelo cieiro. E alguns, mais pequenos, de musgo, com pastores que carregam cordeiros. Lá de longe, onde neva na flor da amendoeira e nos frutos moídos para esmeros conventuais. Lá de longe, onde os olhos são de lã apertados contra a alma. E onde há fogueiras colectivas que assinalam as aldeias e iluminam os cumes e os passos. Um caminho, um burro, uma Maria e um José.


Uns olhos de leite que não cessam de perguntar:
- Avó, por que é que o Menino está nu? Não tem frio?
O meu Natal guarda-se esperançado no punhado de castanhas que vão assar com o peru, pois já não se joga ao rapa com pinhões, mas com feijões. Ou já não se joga nada. Adeste fidelis! Uma vela acesa, um livro aberto na página certa, e um menino coberto com um xaile de lã, pois que os olhos de leite lá convenceram a avó que aquele menino tinha as mãos geladas. Sobre a toalha bordada com sinos e azevinho, há receitas antigas da avó Maria, perfume a canela e pinho, mensagens doces que nos chegam lá de longe regadas com azeite e vinho...



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Flameja o estilo na tez do templo

capaz de cegar como um corpo lendário, muito belo e nu, na garupa do tempo.






«somar só os ramos»




palíndromo

Do grego palin ("para trás, de volta") + dromos ("corrida, pista"), ou seja, que corre em sentido inverso, como a formiga do Sérgio Godinho ou "os rios que nascem no mar".

Diz-se do número ou verso, palavra ou grupo de palavras, em que o sentido é o mesmo, quer se leia da esquerda para a direita quer da direita para a esquerda.

Desconheço a autoria da frase palíndroma lá de cima, assim urdidos ramos de oliveira, mas esta aqui fui eu que criei:
 
 A
 A    V    E
A   V    I    V   A
E    V    A
A

E se o leitor se deixar levar pela asa da imaginação, vislumbrará no poema gráfico uma andorinha adejante parecida às de faiança celebrizadas pelo Rafael Bordalo Pinheiro, que a Catarina (re)vende no Mundo Português, e que sempre me trazem à memória, talvez porque a minha avó as tinha na parede do terraço em redor de Nossa Senhora, uma cantiga de antanho:

Eu não troco o meu casebre
nem por um palácio dourado
que não cheira a rosmaninho
nem tem ninhos no telhado.

Acaba de me ocorrer outra frase palíndroma, muito a propósito do lar cerúleo das andorinhas e do clássico do próximo fim-de-semana:

luz azul
e viva o FCP!

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parei, olhei e vi
pelo esvoaçar da poeira
o vento
e vivi como grande
esse momento



sabia validas as flores e as hastes despidas de assombro
mas não queria resistir à sua pérgola de areia
queria desmanchar-me no regaço do vento









Fui encontrar-te debruçado num choro de ferrugem. Estás sentado na varanda e tens a serrania toda percorrida no horizonte. Aquela ferida de rocha nua, a arder de silêncio, nos olhos tão vagos, implodidos de memória. O vento sopra frio.
- Não olhes mais longe! Vem cá desentranhar-te ao lume.

Ficamos juntos a escutar a chuva. Lá fora, as buganvílias apagam o perfume da lenha e um canto fresco, de águas trémulas, cumpre a Primavera das fontes.